quarta-feira, 8 de junho de 2011

são essas pequenas, minúsculas, idiotas motivações.

Parece que o mundo entrou inteiro dentro da minha garganta. E ficou difícil respirar. Não sei se o ar não quer mais sair, não consegue mais sair ou não pode mais sair. Ou eu estou provocando inconscientemente meu próprio sufocamento, só porque eu desisti momentaneamente de viver? Mas morrer asfixiada não é a melhor forma de morrer. Talvez seja a pior. Eu sinto um pouquinho dessa morte ao subir três lances de escada.Durante esse arriscado e exaustivo esporte, sempre me imagino parando definitivamente de respirar no fim. Uma morte calada, um desmaio, um último suspiro. Pessoas passam pelo meu corpo jogado e sem vida, se viram pra si mesmas, suas próprias vidas e seguem normalmente, seus respectivos caminhos, sem dor, susto ou choque. Ou não. Ou minha morte seria apavorada, aflita, com gritos contidos, expressão facial de pânico, as veias saltando, o ar querendo entrar e sair, mas não entra, nem sai, nem se comove. Fica ali, parado me vendo morrer. As pessoas se aglomeram, gritam, pedem por socorro, a ambulância chega, não sei quantos enfermeiros se alojam por cima do meu corpo e tentam com as mais malucas técnicas tirar dele alguma vida. Mas é em vão. Uma morte sofrida e apavorada, seria assim? Como seria melhor morrer? Eu penso nessas (e em outras milhares) de possibilidades, durante todo o trajeto, mas no final eu chego viva, apavorada, com bombinha na mão, mãos no pescoço pra encontrar o ritmo da minha respiração, gosto de berotec na boca, suor, pavor, tonteira. Me agarro à qualquer coisa, espero o ar voltar, o ar entrar, o ar sair, ok. Não foi dessa vez. Mas tudo bem, não deve ser mesmo o melhor jeito de morrer.

As vontades querem prêmios, precisam desabrochar, sair, ganhar mundo, conquistar. Mas elas se calam, abandonadas, tornam-se imperceptíveis. E então elas viram feridas. Doloridas, cansadas, sufocadas. Elas só queriam viver, mas eu tranquei elas todinhas dentro de mim, ignorei a existência desses gritos de anseio ressoando aqui. Ninguém pode viver assim: tão trancafiado, tão indiferente aos olhos alheios, tão invisível. Um dia, esse alguém vira ferida. Viraram todas aqui na minha pele. Eu pego nelas e sinto: essa é a dor que eu calei. Essa é a vontade de existir que eu tapei os olhos, os ouvidos, e a mente pra não perceber. O que será que tem dentro dessas bolhas? É tristeza, é mágoa, é pesar? Esse líquido amarelo pegajoso, que me dá asco e raiva, é o preço da indiferença? Essa coceira, essa dor, essas manchas, é uma maneira de me fazer entender que eu não deveria ser uma homicida do que é tão nobre, tão necessário, tão vital? E é tão meu. Mas quem disse que eu quero saber de mim? Sabe, eu não escolhi estar aqui, e muito menos ser quem eu sou e muito menos sob essas circunstâncias. Eu tento escolher uns bons caminhos, mas parece que sempre dá errado. Olha só pra minha pele. Olha só pro meu pulmão. Olha só pro meu estômago. Todos eles estão tentando me dizer: essa maneira que você escolheu pra viver, está errada.

Parece que são essas pequenas, minúsculas, idiotas motivações que me fazem sentir viva e brevemente realizada. Não, esse negócio de plenitude se perdeu em algum lugar do espaço, ela não está entre nós. Planejar meu dia, meus horários, minhas tarefas. As receitas pra fazer, os livros pra ler, os médicos pra ir, os filmes pra assistir, os restaurantes pra conhecer, o próximo episódio da série, a próxima cerveja, a hora de dormir, aquele cd pra baixar, meu quarto pra arrumar, 2kg pra perder, o aniversário de não sei quem, o café pra fazer, o chocolate pra comer, fulano pra visitar, 10 minutos da soneca do despertador, o banho quente, um perfume, uma piada, uma novidade besta, a roupa nova, o email pra receber. E quando tudo acaba? Todos esses bestas incentivos da vivacidade desaparecem, deixando só uns buracos, vácuos de silêncio apavorante? Eu subo as escadas. E fico imaginando como eu vou morrer. Mas permaneço viva. No final, eu ainda respiro, mesmo que com uma dificuldade impossível de imaginar em alguém com menos de 90 anos. E me parece uma espécie de vitória, recheada por uma breve e estranha emoção. E quando ela se esvai, então eu tento buscar outros, quaisquer, vários e os mais absurdos e ridículos motivos pra estar viva, pra continuar estranhamente e despropositalmente, a viver. E não entendo como buscar incansavelmente (mas veja, eu já estou cansada) por esses motivos pode resumir a existência, pode nela se basear todo o significado da vida.

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